Meu primeiro ato de filha da puta pessoa cachorra.

Eu acho que tinha menos de cinco anos. Quase certeza, porque eu lembro que tava no pré ainda, e sei que entrei na primeira série com cinco anos.
Então, suponho que eu tinha meus quatro anos e meio, um pouco mais que isso talvez.

Enfim. O ano letivo já tinha começado a uns dois meses e chegou uma aluninha nova, a Olívia. Eu lembro que tava sentada na mesma mesa que uma garota chamada Talisa, que era uns dois anos mais velha que eu. Só tinha lugar sobrando na nossa mesa, então, a Olívia sentou com a gente.
E eu, legalzona, fui enturmar a Olívia. Afinal, ela tinha acabado de chegar e devia estar meio tímida. E brinquei com ela, eu disse: "Olívia, cara de palito!". A Talisa, Deusa da Sabedoria e Protetora dos Fracos, virou prá mim e disse: "Belisa, cara de pau!".
Porra, minha cara (de pau ou não) caiu. Eu fui maior legal, tentando enturmar a Olívia e aquela vaca da Talisa jogou água no meu chopp toddynho!
Aí fiquei guardando esse rancor da Talisa. A minha sorte é que a Olívia notou que eu não tinha falado por mal, eu tinha falado prá enturmar ela. E a Olívia se dividia entre as aulas, comigo e com a Talisa. Mas eu via que ela se divertia mais comigo, a Talisa era chata. Ninguém mais sentava com ela, só a Olívia (eu parei de olhar prá cara daquele filhote de vaca sentar com a Talisa no mesmo dia que ela foi grossa comigo).

E eu comecei a bolar um plano muito muito muito cruel (ah, prá uma menina de quatro anos foi deveras cruel): eu voltei a falar com a Talisa. E eu era muito legal com ela e era muito legal com a Olívia, então, fechou a patotinha das três. Éramos indesgrudáveis, ficávamos juntas nas aulas, no recreio e tal.
A gente tinha o costume de dividir lanche. E eu já tinha notado que a Talisa era muito egoísta com os bolinhos Ana Maria dela. Um dia, a gente pegou nossas lancheiras e sentamos na mesa com os lanchinhos abertos. Eu saí prá lavar a mão e voltei antes das duas. Quando voltei, coloquei um dos bolinhos Ana Maria da Talisa no potinho da Olívia, sem ninguém ver.
Pronto. Fez-se o faniquito infantil.
A Talisa acusou a Olívia de roubo. A Olívia disse que não, e acusou a Talisa de estar desconfiando dela. E eu lá, com cara de "puuuuxa, o queee será que aconteceu?".
As duas brigaram feio. A Olívia levantou e me puxou pelo braço, dizendo "Vem, Bel" (mentira, ela falou "vem, Belisa", porque nessa época ninguém me chamava de "Bel").
A Talisa pegou meu outro braço e falou "não, a Belisa vai ficar aqui comigo!".

Cara, eu lembro como se fosse ontem a cena. Uma me puxava por um braço, a outra pelo outro braço e minha lancheira balançando na mão da Olívia, que já tinha pego minhas coisas prá me levar embora. Me senti uma bonequinha de pano muito filha da puta.
Mas minha vingança ainda não tinha sido plena.
Desvencilhei meu braço da mão da Talisa, olhei prá ela com cara de esnobe e falei "você não devia fazer isso com a sua amiga. Sua cara de pau!". Peguei minha lancheira da mão da outra, nos demos as mãos e fomos andando, largando a Talisa prá trás.

Depois a gente olhou prá trás.
A Talisa tava em pé, no mesmo lugar, chorando chorando chorando. E gritou prá gente, quando nos viu olhando: "EU VOU CONTAR PRÁ TIA!".
A ameaça nem me atingiu. Ver a Talisa lá sozinha, chorando, tinha me feito feliz o suficiente.
Assim, ficou só eu e a Olívia. A Talisa andava sempre sozinha, porque as outras patotas já estavam feitas e nem eu nem a Olívia falávamos mais com ela.

Eu sei que na época eu via a Talisa sozinha com um pouco de pena. Mas aí eu lembrava de como ela foi mal educada comigo e achava que foi mais que merecido!

Credo... quando eu era criança, eu era praticamente uma vilã de Malhação. Bia Falcão ficava no meu chinelo. Darth Vader tremia só de ouvir meu nome.
Sorte que eu cresci e virei emo.


_ouvindo The Flamin' Groovies - Between the Lines_